POEMA ALARANJADO

Um dia, o dia,

cansado de luminosas poesias,

pediu ao sol que fechasse as cortinas

de sua casa amarela,

que saísse menos à janela,

os olhos queriam um breve descanso,

um lugar quase abajur, um gostoso recanto...

O sol, tomado por uma bondade suave,

desligou dois ou três raios, os fachos,

que incandesciam a cidade,

como se apagassem os faróis de uma nave

abrandou o calor, esse de um chuvoso Março,

à sombra dos coqueiros paravam passantes,

nuvens enegreciam o que antes era céu claro,

um poeta distraído, desses a colher palavras

no jardim da poesia, com uma amolada foice,

parou, por um segundo, e murmurou a quem estava

perto uma palavra nova, a que chamou de Noite...

O dia, no fim da tarde que chegava, mansa,

deu ao homem o entardecer mais doce e belo;

este, com sua caneta que as palavras trançam,

fez um poema alaranjado, quiçá quase amarelo...