O MEU RIMANCEIRO * Maré-cheia!
À memória de Marielle
A noite acende as luzes da ansiedade.
O medo tranca portas e janelas.
O grito emudeceu das sentinelas.
As rondas não patrulham a cidade.
Galopam pelas ruas da cidade
sem lei os pesadelos assassinos,
assombração dos leitos dos meninos.
suplício de letal impunidade.
Sofrem e morrem sem saber por quê
as indefesas gentes da cidade.
Que cívico poder da Autoridade?
E que Ordem? Que progresso? Ninguém vê?
Por quanto tempo mais a impunidade?
De quantas vítimas carece a Ordem
para se impor à sanha da desordem,
para haver paz e vida na cidade?
Caíste agora tu, mulher e voz
dos ofendidos todos da cidade.
Morreu contigo o verbo da verdade!
Sem ti, ficámos órfãos e mais sós!
Inunda a ruas todas da cidade
a dádiva sangrenta --- maré-cheia!
E um povo adulto indómito semeia
searas de amanhã e liberdade!
Há sempre páscoa em tempo de cordeiros
e sacrifícios velhos de impiedade.
Que a paz floresça livre na cidade!
Banidos sejam cruzes e madeiros!
José-Augusto de Carvalho
Alentejo, 20 de Março de 2018.