AH, POETA...

Ah, bom poeta,

que usa palavras lavadas e sem manchas,

que acredita ser um caridoso esteta

operando milagres com palavras brancas...

Poeta, bom poeta,

que arde em fogo fátuo de amor brando e sem frio,

lava-se, todo dia, com palavras que se prestam

a vesti-lo com sentimentos de prazer e beócio cio...

Ah, poeta, poetinha,

que vive de prazeres dicionáricos e anêmicos,

que quando vai parece alguém que foi e vinha

nos anunciar novos sonhos acadêmicos...

Ah, poeta de alma limpa e que ao sol seca no quarador,

sem lembranças de lutas, combates, revolução,

fotos nas paredes, risos, abraços, nenhuma pequena dor,

no máximo um amor não correspondido no coração...

Poeta, poeta cheio de versos de amor bem nutrido,

que escreve semanalmente suas sensações ordinárias,

que pesa tanto quanto um cadáver de ferro fundido,

cuidado com suas palavras limpas, cheirosas, diárias...