Expulso do Jogo
E ninguém é isento do aroma das flores, que quase sempre entorpece os pulmões
Ninguém respeita alguém que permite ao acaso abrandar seu nome
Eles são inquilinos da escuridão, paladinos da incerteza com suas cruzes debaixo da tempestade
Por que buscar conforto na inércia?
Eu sei que o coração é a dinamite da mente
Eu sei que admiração é o sopro delicado que cria a bolha
Eu sei que a decepção intervém na batalha entre o hábito e a novidade
Mantenho as flores distantes e o ar extraí todo sedativo de seu aroma antes de me atingir
Que sorte ter sido expulso do jogo...
E ninguém discorda do uso da esperança, por um temeroso desrespeito ou deformidade no cotidiano
Todos adaptam sua índole, cerram os dentes para eternas verdades
Sobreviventes da infecção diária, trapaceados com o sonho de imunidade, antagonistas da realidade
Eu sei que o desconhecido não se exibe mais
Eu sei que não é mais seguro seguir um exemplo
Eu sei que o destino é só um plano B
Eu sei que as defesas do presente são as atrocidades do passado
Eu discursei no idioma da violência para que a paz me desse ouvidos
Mantenho o equilíbrio e não me engasgo com a fumaça da locomotiva
Eu sei que uma opinião é apenas uma faísca que tenta debochar do sol
Que sorte ter sido expulso do jogo...
E ninguém pode ser normal sem possuir alguma ambição
Velando os números com tanta lascívia, há quanto tempo o musgo selou sua decência?
Eles desprezam a liberdade de ter em mãos o vazio, confundem torpor com nirvana
Eu sei onde as mãos frias dos engravatados assediam
Mas eu sei que não suporto os ecos de um castelo, eu sei que pés descalços acariciam melhor o mundo
Eu sei que o dinheiro é tutor da paralisia da escolha
Eu sei que acentuar o efêmero é banalizar a beleza
Eu sei que essa é uma geração fantasma e eu sei que ela ocupa espaço demais
Mantenho meu triunfo enquanto cultivo a miséria dos "heróis"
Eu sei o quanto a ignorância se tornou uma divindade poderosa
Que sorte ter sido expulso do jogo...
E ninguém cultiva o respeito perante a vigilância de um Deus exausto e também decepcionado
Porque acham que o respeito se descobre filho do medo e neto da descrença
A gratidão deles está num baú abandonado nas profundezas do hipocampo
Quando a hierarquia vale mais do que a aliança, quando genocídio é sinônimo de lealdade
Eu ainda sei sorrir para o céu nublado
Eu agradeço por compreender tão pouco, por isso não prezo pela ausência do inusitado
E quando me sinto sozinho, o sol perfura as nuvens, os pássaros batem as asas e o vento faz as folhas aplaudirem
Mantenho o mesmo refrão entre os versos das estações
Eu sei o quanto tentam deturpar a melodia
Que sorte ter sido expulso do jogo...
E ninguém aceita ser ninguém, mas ninguém diz ser alguém
Enquanto as grades existem, é vergonhoso ser pouco miserável e preservar a nobreza no semblante
Modificam a bondade para ganhar em dobro aquilo que é compartilhado
Modificam a maldade para que o talento se torne uma entidade leprosa
Eu sinto a brisa do Armagedom se aproximando no horizonte
Eu não me pergunto sobre esse estado de graça
Agradeço pela aleatoriedade não me instruir excessivamente
Mantive minha escolha e minha criança brincou do lado menos verde, porém, o mais vasto
E quando a diversão se tornou uma pauta ideológica
Que sorte ter sido expulso do jogo...