O LUGAR DE MORAR
Morei aqui e ali,
perto e longe de onde sempre estava,
sob chuva e sol e estrelas cadentes,
distante e ao lado de muita gente,
nunca um lugar definido,
me sentia mancha no vidro,
a escorrer pelo mundo,
foto sem revelação,
água de riacho,
no bico do pássaro pedaço de pão...
Até que, num resvalo de encontrão na rua,
trombada sem nenhum motivo,
vi minha alma ali, toda nua,
a quase perder os sentidos,
havia achado o lugar
onde iria para sempre morar,
eu, cá, junto, comigo...
Sem a necessidade de teto ou viga mestra,
paredes aparentes ou de alvenaria mui sólida,
como se um sinal viesse pousar em minha testa,
suave e pleno sem sentir nenhum tipo de cólica,
diante de mim e de portas abertas, ria, calada,
ela, sementeira de verbos, cálida, a palavra...
O lugar onde poria o que eu tirasse do indivisível,
a cada letra composta o nascimento da alegria,
a descer e subir o rio da correnteza mais incrível,
a preparar a polpa da mais comestível poesia...
Assim o é e tem sido e será até o último luar,
casa de homens e mulheres e entes fabulares,
labirinto com fim e começo para se sair e entrar
como se cada um tivesse um unicórnio de lares...