ESTATUTO DA POESIA
Se soubesse o trigo para onde iria,
se viraria farelo ou pão,
se soubesse a poesia
que iria verso virar ou palavra em solidão,
teria a filosofia aceito o pressuposto
que atrás de toda face há um outro rosto
espiando o mesmo posto
à frente de si?
Se soubesse o homem de cada praticado ato,
o que faria, de fato,
com o outro à sua frente sentado
se furtando da fruta macia e carnuda,
ou diminuindo a porção de delícias
do seu já diminuto prato
de alma desnuda?
Se soubesse que a corte das palavras pesadas
pesaria aquelas que foram cantadas
pelos lábios dos profetas da economia,
o que será que faria se soubesse
que palavras esclarecidas
como escola, ciência,
conhecimento,
já servem ao estatuto da poesia?
Se soubesse que a mesma que está na constituição
está também no texto da oração
subordinada
ao nexo sutil do encantamento
que vive dentro de cada poesia pronunciada,
o que faria, então?