também o poema, desse penar que não esmorece, finda
dentro de cada um de nós existe um poema, em brasa ou em flor
uma ideia em gestação, um projeto novo de ser novo ser humano
mas nem tudo é fácil como tomar sorvete
encarar o poema é um desafio enorme
ideias queimam
flores murcham
a novidade tem o frescor do orvalho, dissipa tão logo veja a luz
depois de gerados, os filhos crescem e conquistam vida própria
o que era poesia ontem?
metas, mentiras, ideias?
tudo é dor
respirar dói
abrir os olhos dói
o sol na pele dói
tudo o que se queria ser agora é tatuagem
amor encoberto, camadas de não sei dizer
as palavras são inúteis, o poema é um aborto prematuro
no ato de saber-se 'ser aqui' sabe-se destinado ao fim
a gestação é inútil se não se morre mais
a morte necessária, o regresso na dor
a imortalidade é conquistada nas enfermarias
é a química ao desserviço da humanidade
se morresse, o poema veria a luz
mas a eternidade plastifica a poesia
também nas veias plastifica as ideias
é a certeza da sexualidade dos homens
orgulhosos de terem nascido homens
no mundo dos homens que pisam flores
que pisam poemas e fêmeas
metas, mentiras e ideias
é verdade, dentro de nós um poema pede calma
mas também pede por novas armas
por instrumentos e voz
escrever é conquistar o direito de nascer, de conviver
de ser e manejar habilidades de enfrentamento
a eternidade é para quem já perdeu a esperança
é a última cruzada para salvar os santos dos ultimos dias
nesse canto um quase-poema exalta a morte
a morte natural que vem no tempo certo
não a morte golpe desferido por língua maldita
e canta o canto
longevidade aos homens e mulheres de boa vontade
vida plena aos pares
às ideias casuais
ao ocaso no cais
vida plena aos inúmeros ímpares
logo aquele frescor será nuvem, chove orvalho ou chora
contudo, nasce a flor para não durar mais que o dia
e conserva desde a semente a graça da mortalidade
também o poema, desse penar que não esmorece, finda