O RIO RIA E ROLAVA

Um dia, o rio, na solidão de suas gotas,

resolveu abrir a boca

e contar à chuva

que sentia frio,

que estava cansado

de se sentir

rio...

A chuva, que nunca cessa enquanto canta,

não tem torneiras e nem adianta

querer que pare por sentimento,

olhava o rio por fora e lhe ia dentro

a rolar sobre pedras e musgo,

a sentir sobre a pele d'água

a mão macia do vento,

ouviu do rio o muxoxo

e lhe perguntou se estava louco,

o rio ria e descia a escarpada estrada,

já não ouvia mais nada,

nem via o que ao redor se passava,

se sentia bem sem sentir o melhor,

ia responder à chuva o que lhe dava

quando, num turbilhão, quase um revoar,

perdeu o fôlego, num mergulho d'alma,

se entregou ao mar...