AS COISAS DA NATUREZA
Que bom que o sol saiu de casa,
trouxe suas filhas todas em rajadas
de cor laranja, todas em brasa,
e eu, aqui em baixo,
a respirar a brisa e ver os fachos
de luz que descem sobre a cidade,
que bom que a quentura nos cobre
e dá-nos essa intensa claridade...
Quem bom que posso falar das coisas da natureza,
cada uma com sua delicada beleza
deixando longe os assuntos espinhosos,
os cães que ladram, os lobos,
os pântanos, os desertos arenosos,
homens de mente fria e coração gelado,
que buscam tesouros e não respeitam o sagrado
direito da partilha, se afundam no lodo,
que roubam merendas e se escondem em suas tendas
que estendem diante de palácios na cidade central;
que bom que é falar do bem e pular essa parte do mal...
Sentar à beira do riacho e mergulhar os pés na água fria,
ver os pássaros que dentro do vento deslizam,
as folhas que cumpriram sua parte e agora se vão,
rolam sobre a pele do riacho se misturando à multidão
de acontecimentos paralelos, galhos pendidos que ondulam,
as nuvens que vagam sustentadas por mãos de chuvas,
seus corpos aquáticos suspensos no espaço,
o que as criam em seus belos traços,
o aroma de esmagadas uvas...
Que bom se largar à deriva e conhecer os segredos
das coisas que apenas estão por aqui em várias combinações,
viver com elas, nutrir-se delas, estar com elas, sem medo,
mosaico de sonhos colocados em todos os corações...