DENTRO DO DENSO PRÓPRIO ABISMO

De que adianta alma prolixa

Se a boca é concisa?

A prolixidade da alma gera caos

Interioridade barulhenta

Implosão de ruídos e palavras

Sopro de imaginação desatada

Que nunca existirá

E se fazem e refazem

Como bloco de razão desmedida

Desmesurada e pequenada,

E por fora, casca plácida

Esbelta e forte

Olhos pequenos e cansados

Olhos que miram outros olhos

Mas só olham pra dentro de si

Do próprio barulho desmedido,

Olhos que só enxergam

O próprio abismo intocado

E intangível escuro:

Como Epicuro

Em nosso prazer narciso,

Falo só pra fora da boca

Quando preciso,

Mas querendo não falar

Querendo as palavras retidas

Dentro do denso próprio abismo

Fora por fora só ora, o dente siso

E ruídos expelir afora

Pra esconder a relva

Das reentrâncias e saliências

Ainda que muito custe o feito

De expelir o próprio peito

No calar das aparências.

Ainda que milhares de versos sejam escritos

Estarei a anos-anos-luz

Da meta-escrita e meta-poema

Mas sim no calmo calvário dilema

De ser ou devir, diamante e diadema.