ANGÚSTIA POÉTICA

Olhar perdido sobre um imenso espaço vazio

Cabeça em vertiginal vôo perpendicular

Na boca um gosto cáustico

De fala partida ao meio

No peito as vibrações de um susto que ainda virá

Há um desejo infrene de se expressar:

Escrever, falar, cantar, gesticular, gritar...

Quebrar o nó que sufoca atravessado na garganta...

Cuspir fora todas as insatisfações, frustrações, desejos (confessáveis ou não).

Há uma vontade de buscar isolamento em local ermo, incerto e jamais sabido

E olhar apenas para dentro do próprio eu

Ainda que se vislumbre o horizonte longínquo ou o infinito etéreo.

É quando a poesia jorra através dos poros

Como suor aos borbotões após o esforço físico em dia de mormaço

Ou como o brotar incessante dos olhos d'água nos grotões.

A poesia surge como uma borboleta irrequieta em campo vasto

Que o poeta aprende e reaprende a capturar na rede da sua angústia.

No silêncio de um íntimo espectral ele capta os versos pacientemente

Como um garimpeiro de bateia em punho

Compenetrado à cata de pepitas por entre os seixos.