Como Será Na Hora de Morrer?
Como Será na Hora de Morrer?
Como será a hora da minha morte?
Será romântica,
assim como a do Cyrano, num claustro, ao entardecer,
ferido de morte ao lado de sua amada
que até então continua a nada saber
do seu imenso e antigo amor,
das suas cartas há anos por outro assinadas,
agora já morto mas sempre idolatrado,
mais pelas palavras emprestadas que dissera
do que pela lembrança dos beijos que
nunca houvera,
ou dos carinhos no corpo
que nunca tivera.
Cyrano, o homem que nunca fora o que quisera ter sido,
apenas fiel e constante amigo,
soldado e escritor ambíguo,
no final, enfim,
se vê reconhecido.
“C’est mon panache”,
suas últimas palavras
com a espada na mão
a cabeça no regaço de sua querida, enfim unidos,
que o abraça,
é feliz por instante pequeno e fugaz.
Morre.
Ou será dramática,
como a do trovador Manrico
que pode escutar antes da sua execução
- suprema felicidade –
Leonora sua amada, também morrendo, dizer
“antes morrer tua do que com outro viver”...
Terei a ventura de chamar por Roxane?
Terei o consolo do amor inegociável de Leonora?
Uma tresloucada Lúcia, demente de amor por mim
cantará um prólogo para o meu fim?
Ou estarei numa UTI, bem cuidado, limpo,
entubado,
isolado de todas as bactérias,
de todos os vírus,
morrendo só?
(Publicada in A Amada do Sonho, Frente Editora, 2001)