primavera contida
Quando eu houver chorado todas as lágrimas
furtadas, furtivas
Ensopada de todos meus suores e rancores
que eu conheça a redenção
que eu conheça alguma paz
E que sinta a morte com brandura,
com a candura dos anjos
Quando eu houver chorado todos meus mortos
Que eu celebre a vida,
O renascer do sol no dia seguinte
A lua embevecida no mar de crepúsculo
sangrento, a dilacerar no horizonte todos meus instantes
Mas são tantas as lágrimas,
e tudo é tanto
que dá vontade de chorar.
A música me lembra de algo
que não quero lembrar
O passo bêbado erra o caminho, afunda na lama e
se dirige sóbrio em direção de si mesmo
Os olhos submersos em lágrimas,
em sua estética aquática e borrada
vê a transparência das coisas, o cristal límpido
diante da tela do inconsciente
A nos sussurrar regras, princípios e atavismos.
Eu antes de ser o que sou,
já estava predestinada por minha história,
por minha herança e
por meu remorso.
Quando eu houver conhecido o fim de todas as mágoas
Serei livre para me estender até o horizonte
E deixar lá, flanando os nacos de esperança
a borboletar no espaço a beleza das cores,
E o cheiro intenso
de primavera contida.