Poderes cotidianos
Posso fazer algum café
Quente ou morno
Posso fazer alguma graça,
Contar uma piada da qual não me lembro mais...
Posso ainda fingir,
Ser hipócrita, dar tapinhas nas costas
E rir da tolice e ingenuidade de todos
Seria mais fácil.
Seria mais rápido .
Menos estressante
Viver sob a sombra das aparências
E no ritmo ditado das conveniências
Mas minha natureza se inclina,
Se estufa
Reage bem antes de eu pensar
É automático
O meu inconformismo
A curva centrípeta pode dobrar meu corpo
Fazer-me cair
Mas as máscaras sociais não me obrigarão
a ser
quem não sou
Não me exilarão de mim mesma
A buscar os falsos afagos da platéia
A vida não é palco.
Não há script prévio a ser decorado e traduzido.
Não há gente na cochia a lhe sussurrar as deixas...
E nem a pantomima esperta das atrizes
Mas há a tatuagem subcutânea da genética,
da história, dos afetos
do laborioso crochet dos tempos vividos.
Escapar a isso tudo, é desafio.
Nos bastidores não há maquiagem
Há apenas a alma, banhada
em segredos e
solidão.
A espreita de se libertar ao vento,
Para a chuva
Ou num poema qualquer de fim de tarde.
Conhecer o ocaso
É adentrar na parte negra de nós.
E sem luz , imersos em nós mesmos
É mais fácil descobrir o que poderíamos
fazer,
o que poderíamos decidir
ou hesitar
enfim simplesmente viver
com os poderes cotidianos.