Irremediável
Foi numa tarde fria que o tédio obrigou-me a pensar.
A existência do meu corpo há muito rendera-se a irregularidade
e o som brotando no rádio parece um emaranhado inútil de palavras e melodias.
Eu tinha a verdade enterrada num canto vazio do jardim transbordando fé e serenidade,
procurava a infância guardada no porão sob a antiga mobília
que sustentava a carência e a felicidade.
Tinha a saudade escondida nas palavras relaxadas que perpetuam a voz aguda e por vezes irritante
e tinha a certeza solta pelo corpo feito vírus sem cura
que só morre quando o corpo se entrega cansado de lutar,
desgastado, buscando no pultimo suspiro a paz.
É só a herança presa eternamente ao que se é,
sem culpa nem consolo,
já que não se pode deixar de ser nem de estar.
Eu entendi que o medo sucumbe a vontade
e que a voz só é ouvida quando o silêncio já explicou a complexidade do que não se quer dizer.