Todos precisam de (...)
Todos precisam de uma ousadia para serem poderosos e aproveitarem oportunidades.
Eu, que fiz inúmeras ousadias em vida, mas em sonho, não aproveitei nenhuma.
Só uma que outra, como o beijo de uma menina requisitado pelo meu tabelião de finanças
Um desejo preso que por coices e murros fora empurrado da culatra de meu destino afora.
O que mais fiz foi dormir. Sonhei, acordei e conquistei. Era o que eu queria! Mas depois
Vieram novos desejos e minha vontade foi aos poucos minguando em ficar na esfera onírica.
O mundo tornou-se fuzzy, um redemoinho de palavreados e interjeições que eu já não entendia.
Um novo dia como nova vida em que eu pensava e nunca compreendia o que afinal seria
Nem o que fazer primeiro, com todos os céus e barulhos de rua, toda a agenda e o calendário.
Todos precisam de ousadia... eu sei. Todos precisam ser inabaláveis e sem trauma algum
E se os tiverem — O que é para cada um — devem superá-las, como a nuvem supera a estrela
Mas tudo que falam sobre isso eu pouco entendo e faço pouco esforço para interioriza-la
Porque... não sei. Porque nada. A vida segue sem manhas nem ideias, a vida segue solamente.
Na praia esbelta onde certa vez segurei a mão da menina querida que eu chorara
Nas ruas geladas do inverno onde eu e ela, de olhos tais chamas, mão a mão caminhávamos
E a falta de ousadia de querer ser eu e não querer ser nada ou outro que passa no lado da rua
O eu não querendo ser eu e sim o cão que entra na casinha tremendo de frio, cão invejado
Sem experiências para relembrá-las, ó cão amarelo, tu sim que és tu, com pessoa e tudo
Ousadia mata. Mais vale ficar em casa, não ser ninguém, e não convidar olhos alheios
Para lembrarem de nós depois.