Os Despojos da Consciência
Tombado ao cansaço do corpo,
Exausto de não encontrar a suposta justiça
Que tanto me moveu,
Até mesmo acima do amor,
Ainda que de modo indevido,
Porém, não comungo com a dissimulação,
Tenho o dever de ser honesto para comigo.
Assim mergulhado numa dormência conveniente
Que ao menos permite sobreviver ao cotidiano.
Eis que ainda que contida,
Minha alma é pura rebelião.
Resignado, construo castelos de paciência,
Impulsivo, tomo as rédeas de meu cavalo selvagem,
Eis que então me suponho a trotar,
Mas a vontade será sempre correr livre
Sentindo a brisa a tocar a face
Avançando a caminho de uma utópica liberdade.
Descrente dos ideais jogados na lama pela sofistica,
Querendo cuspir ao lado em desprezo a hipocrisia.
Eis que apenas aguardo o passar do tempo,
Não sou dono do roteiro, apenas atuo,
Sou minha total realidade
Ainda que vezes a contemple como ilusão.
O que é que pode valer a pena?
Se existe algo, suponho ser um além de mim,
E neste eu encontro o incômodo de ser.
E quando assim penso, sinto-me ingrato,
Pois que minha razão
Por algum motivo se expande em fé,
Numa percepção de Criador e criatura.
E deste modo relevo de modo estoico o ‘ser ou não ser’,
Este tudo e nada que são polos de inúmeras possibilidades,
Eis que na estatística se faz possível
Haver um encontro com a possibilidade da misericórdia.
E nem por todo sofrimento, e nem por toda alegria,
Ainda assim, bem pouco somos.
No entanto, temos que nos constatar,
Não fugir um único minuto da vida que nos faz presente,
E ainda que a morte cause tanta aversão,
Melhor é ir com o tempo se ajustando a ela,
Pois que falecemos a cada instante,
Eis talvez nossa única certeza,
Dentro de uma espécie de ‘matemática’ biológica,
E por tanto pensar, suponho ter uma consciência,
E ao querer encontrar algo,
No momento que me ver desprovido de vida,
Haverá de ser tudo o que me resta,
E que não se engane,
Ainda que a tenha,
Não sei se me pertence,
Se realmente sou dono de algo.
Apenas suponho existir,
Pois que eis neste além de mim,
Vejo a imagem de uma garrafa atirada ao mar,
Por esta solidão que se expressa em um naufrago
No oceano de vida
Na esperança de haver um lugar por chegar.
Uma síntese entre o alfa e ômega
Que estou bem longe de entender,
Mas que de algum estranho modo
Pareço sentir em meu peito
Como que se houvesse
Uma espécie de coração
Para minha alma errante.
27/05/2023
Gilberto Brandão Marcon