Fantasiando com um homem morto

Nunca o conheci

Você já estava morto

Já haviam recolhido seu corpo

Quando, nas páginas policiais, eu o vi

Seu rosto era tão doce, sereno

Um semblante de pureza impecável

Ao que se sabe, um amante implacável

De vida intensa e destino nada ameno

Você me tocou

Aí do seu lugar sobrenatural

Na minha insignificância imortal

Ascendeu minha alma e me acordou

Quisera eu ter sido

Uma de suas meretrizes

Em seus braços ter me perdido

Tornando-o uma de minhas cicatrizes

Você partiu antes

De que eu pudesse acariciar seu rosto,

Sentindo, em meus lábios, seu gosto

Em meus ouvidos, seu gemidos delirantes

Antes que eu pudesse tê-lo entregue

Ao meu pecado, à minha sede, à minha alma

Agora seu fantasma me tortura e me persegue

Ao passo que fantasiar com você me acalma

Onde está você agora,

Meu pecado secreto, meu quase amor?

Que me faz retomar, pela vida, o rancor

De passar a desejá-lo toda a hora

Por que se ri de mim, aí na eternidade?

Deliciando-se com a minha solidão,

Presa à minha própria mediocridade,

Desperdiçando versos tolos em vão

Tolo, meu querido, sinto

Em dizer que foi você de ter partido

Deixando meu espírito só e perdido

Por você, sedento e faminto

Só mesmo a imaginação,

Mãe da arte, musa da criação

Alivia-me a dor de não estar com você

Ferida que arde e o pior é que se vê!

Mais que isso, eu quero ver!

Construí para você um paraíso

Na minha mente, onde nunca irá perecer

Fico com você e abro mão do meu juízo

É o amor, para quem vaga na solidão,

A água para o deserto, a terra prometida,

A clemência aos condenados à escuridão,

A esperança da promessa não cumprida

Como é você para mim, meu quase amor,

Agora, em meus versos, eternizado

Impregnado em meu clamor

Por um sonho não realizado