Caixão
Eu me lembro de quando perdi a cabeça
Não físico, metafórico.
Quando era muito eufórico
E não sustentava meu interior.
Quando as paredes perdiam a firmeza
E tremiam apenas com meu caminhar.
Eu era diferente. Morri centenas de vezes para chegar até aqui.
E não ressuscitei de todas elas.
Ainda acordo debaixo da terra,
Ou com vermes que rastejam sobre minha pele,
Ou choros perdidos em noites esquecidas,
Varridas com o tempo, analisadas, ressignificadas
E quaisquer outras bobagens sobre superação.
Ainda choro repentinamente em dias felizes
E dou altas gargalhadas em dias de luto
Sou a favor do breve, do curto, do enxuto
Mas sou o primeiro a tagarelar.
Repetidas vezes eu me repito...
Ou melhor, repito:
Repetidas vezes eu digo a mesma coisa
E nem percebo quando sou reincidente
Talvez seja apenas a necessidade inerente
De voltar e me explicar.
De tornar tudo claro, límpido
Assim como meu teto de vidro
Que jamais terá uma pedra arremessada por mim
Eu já fiz de tudo, já tentei todas as coisas
Mas nunca uma segunda vez. Algumas vezes nem uma primeira
Algumas vezes era apenas uma sórdida brincadeira
Que minha mente insistia em praticar.
Uma história infinita sobre infinitos personagens
Felicidade, amor, conquistas, miragens
E quaisquer outras bobagens sobre o meu fim.
Mas não foi assim. Não havia de ser.
Não havia o porque. Não havia razão.
Desta vez não me levanto deste caixão.