VOYER
São três horas da manhã.
Olho através da minha janela.
Da minha janela como tantas outras janelas.
Protegida pela cortina, me faço voyer.
Olho através da penumbra,a rua está quase vazia, apenas auguns boêmios. Outros que como eu, se embreagam dos licores metafóricos da noite...
Poetas usam descaradamente a noite
Boêmios abusam da noite
... Solitários também!
A noite não possui portais
Nem cobra pedágio
A noite é de todos
E não pertence à ninguém!
Há na surdina da madrugada,
quando todos estão alheios ao mundo
cultuando os seus próprios desejos,
sem egoísmos, apenas se ocupando de viver, um quê de liberdade sem preconceitos, embaraços ou coibições
que em nenhum outro momento há!
É quando a vida acontece...
Um dia, quando os cabelos brancos cobrirem as têmporas e doerem os ossos, há de se lembrar deste tempo como um sonho vago em algum canto de uma memória senil.
... Apenas um sonho.
Nada mais!
Um gato preto cruza a rua.
A ressurreição de plutão!
Meus pensamentos voam longe, outras paragens, outras bocas, outros braços, outros quintais e outras realidades...
Terras por onde passei, amores aos quais me entreguei...
Ah, se eu pudesse viver outras realidades!
Voejar por outras paragens
Sentir novas aragens...
Quem sabe eu mudaria as coisas de lugar, támbem as cores das paredes,
os lugares dos quadros!
Estas paredes que guardam tantas estórias que a ninguém intetessa,
que ninguém irá contar.
Mudaria, talvez de profissão.
Os empregos banais..
As poucas andanças.
Talvez abraçaria a estrada,
seria apenas poeta,
nada mais.
Também seria mais contida, menos dada, menos tanto...
... Sofri por me doar demais!
Por dar tanto de mim, numa partilha descabida e desenfreada.
Não sou uma mulher triste.
Reservada, talvez,
Introspecta, talvez,
Solitária, com certeza!
Mas gosto como a solidão se deposita pelos cantos da casa, pelos cômodos, por cima dos móveis e do teclado.
Parece poeira,
Mas é solidão.
Não faço questão de removê-la, não mesmo!
... Hoje me é uma condição necessária.
Antes suportada, talvez consentida, hoje ansiada.
Porquê gosto de pensar na vida e no jeito em que as coisas são..
Aceitá-las, até embala-las...
As "coisas" são!
E não há o que se lamentar.
Não há meu amigo, não há!
Lamentos são poeira ao vento.
Não trazem gozo nem contentamento.
... Mais um bêbado cruzou a rua!
Anda trôpego
A luz de um poste permitiu-me ver o seu rosto, estava cansado, mas não triste!
E já são quatro horas.
Demorei tanto tempo para pensar sobre o que escrever neste poema, e quando terminei, percebi que só versei bobagens!
A vida é uma grande bobagem!
Não deve ser levada à sério, miito menos vista através dos dedos de uma poetisa cansada...
São estrofes tortas
Linhas mal traçadas
Leve-as,
Leia-as ou queime-as, tanto faz
Eu as escrevi pra você,
Para te ludibriar ou ajuda-lo a psssar o tempo...
... Ahh, e como o tempo passa rápido, querido!
Mas não te atentes para mim.
Porque eu, sou apenas uma mulher na janela, uma voyer, numa janela que ninguém vê.
Elisa Salles
(Direitos autorais reservados)