TOLAMENTE MUDO
De manhã. o morador de rua,
sobrevivente das ruas de São Paulo,
grita no meio da praça da Sé.
O morador deve ser louco
e assim totalmente lesado
é tolamente livre.
Ele grita
e a loucura o afasta
das questões do mundo,
do processamento das coisas,
das possibilidades,
e da existência de limites
É isso o que deduzo agora,
de qualquer grito.
Passo na praça
no momento do grito de outro morador de rua,
ele berra como um cão respondendo
ao chamado matinal de outros cães.
É matutino
e soltará toda a matilha em instantes,
pois já escuto um terceiro grito.
Esse é fundo, doído e comprido.
Três gritos,
eu deveria acompanhá-los.
Gritar como um quarto morador,
respondendo ao chamado
de um delírio que tive à noite,
mas prossigo silenciado,
totalmente calado,
tolamente emudecido
rumo ao meu escritório.