surdez

estamos surdos aos apelos do mundo

é um silêncio denso

que dá para cortar com uma navalha

é uma ausência de sentidos,

nuvens, trevas e solidão.

estamos surdos aos gritos do mundo

é um silêncio-muralha

que nos isola das angústias alheias,

é silêncio insular

a nos ilhar dentro de nós mesmos

não ouvimos nem mesmo a voz da consciência

não ouvimos,

ficamos imersos e translúcidos

não percebemos nem a vibração do som

e no agnóstico momento

onde tudo é inércia e mesmice

a pluma flutua a bailar

estranha, diante da orquestra invisível

não ouvimos os tiros,

não ouvimos as granadas que explodem,

os corações que eclodem diante da indiferença

diária e brutal

não ouvimos o desabar das emoções

que soterram almas

erosivas pelo isolamento.

essa surdez

essa certeza do falso silêncio,

essa dúvida diante do sibilar das palavras,

o eco e grito se respondem

mutuamente

perfazendo uma maiêutica

vulgar e coloquial

na minha semi-surdez

a necessidade de captar ao longe

a crina ao vento,

o farfalhar das folhas secas,

a trilha sonora das sombras da tarde.

esse silêncio como um fog

é neblina, é nuvem

e, é dúvida

é a pausa de meditação

e movimento.

rijo permaneço diante tudo

inflexível,

impassível

como se ausente estivesse

como se autista fosse

a balançar em busca do

pêndulo perdido

essa surdez

é lirismo contido

é mistério inacabado

é opus dei sem deus

é recital de pássaros,

na manhã angulosa de

chuva fina.

GiseleLeite
Enviado por GiseleLeite em 26/10/2007
Reeditado em 26/10/2007
Código do texto: T710647
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