Domingo

Era domingo de asfalto negro,
de vento frio espalhando sons,
vozes de famintos,
cansaço da semana vencida,
do suor derramado apenas,
apenas para se viver mais um dia.
Era domingo na mesa farta,
na garganta deslizante a champanhe,
no olfato saboroso,
no fato majestoso,
no assado pescado enfeitado
pela harmonia da sala em cores.
Era domingo na tarde gélida,
corpos aquecidos embalavam, férteis,
variações contínuas, pedaços, traços
quase soberbos, válidos ou inválidos,
descobertos ou encobertos,
vazios, nulos, sem razões lógicas.
Enquanto que,
não eu, nem você,
nem a vida e suas nuanças
poderiam fluir de tantos um pouco.
Que fosse uma palavra
na tarde que já se preparava à entrega,
a total satisfação de ser cobiçado,
resgatado pela noite.
Mais uma vencedora roubou aplausos,
efusivos contágios dos vencidos
que haveriam de vê-la sucumbida,
morta na manhã raiada.
Era domingo e sem saber pude sorrir.
Fui tão medíocre quanto,
quanto este resto que aplaude, vibra
pelo prodígio da natureza,
até mesmo para criar esta contração
chamada sorriso.