Tempo
Encontrei recados dados
Palavras soltas e perdidas
Ruídos de tempos idos
Milhares de histórias não contadas
Retratos rasgados
Tinturas vencidas
Pinturas ruídas
Mofo
Lodo
Fungo
Teias se formam
Ceias se foram
Jardins emaranhados
Solo seco
Paredes sujas de lama
Espelhos partidos ao meio
Tão meio de mim
Metades...
Fósseis de destinos entrelaçados
Magnitudes de tempos viris
Montagens de esquemas padrozinados
Papeis riscados de giz
Roupas velhas
Cabelos grisalhos
Chás de tão frio
Gelados
Humor rígido e sem dentes
Travessuras inexistentes
Recados de um tempo que ninguém sorriu
Mas eu sorri
Eu vivi
Sorrateiros e impetuosos os pecadores
Terços pregados na parede
Com quadros de flores
O relógio não bate mais
Eu não bato mãos
Não mexo pés
Não falo quase nada
Já não sou quem antes era
Não brinco com minha primavera
Mergulhei na escuridão
Sou tão velha e tão partida
Minha esperança
Já foi perdia
Só me resta assim o chão
Entrem em meu castelo
Descanso assim em paz
Não me verei jamais
Como alguém que quero ser
Sou pedaços de mim rasgados e emendados por aí
Sou tão amarga como doce era
Sou tua lembrança velha
E assim então vou ser
Sou as cronicas da vida
A juventude esquecida
A vaidade soterrada
Sou o tempo que chegou para mim
Entre trechos de livros amarelados
Com cabelos finos
Fraquejados
Com olhar de vidro
E sorriso de morte
Sou tão tu como serás eu
Sou em teu ventre o que tu perdeu
Sou tua verdadeira sorte.