Ideias perigosas

Conversei com Donald anteontem

e depois de muita arenga

ele me disse: sabe Negron,

se eu morresse agora,

se eu caísse aqui duro feito

o pau de um tarado

ninguém sentiria falta,

não faria diferença,

sabe, essa é uma ideia que sempre

me vem à cabeça: vou sair dessa

do jeito que entrei: sem ser convidado

e saído sem ser mandado,

mas isso acontece com todo mundo porra

pouco importa se no topo da montanha

ou com todas elas sobre os ombros,

serei só mais um na fila desse pão maldito

que a vida amassa e despreza.

Eu escutei silente, tinha o gosto da cerveja

na língua, perto do início da goela,

deixei Donald viajar, afinal também tenho

minhas filosofias de indiferença e suicídio.

A merda é que essas ideias perigosas

assolam qualquer um, como ele bem disse,

não é privilégio, muito menos castigo

é a cruel sentença que mantém a lucidez

atenta ao fato de que não pertencemos

a este lugar, somos forasteiros.

Então voltei a meu cafofo em Tortuga

e desfiei na minha ressaca

a vaidade macabra de querer exclusividade

no festim diabólico da insignificância

da vida.

Donald estava e não estava certo,

mas os pregos que ele bateu

em minha cabeça atormentada

me atormentam até hoje:

ninguém vai notar se eu

tomar um analgésico

ou sair dessa agora.

Grouchesco
Enviado por Grouchesco em 16/11/2019
Reeditado em 19/11/2019
Código do texto: T6796398
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