dias contemporâneos
por onde andará Quixote
sem Sancho Pança?
aonde estará Dulcinéa
e a Penélope,
Dalila,
Helena de Tróia e
Joana D"arc ?
aonde guardamos
arquivadas as memórias
de nosso ídolos,
de suas façanhas,
áfricas negras sem marfim ?
aonde deixamos esquecida
aquela pessoa enorme,
vasta, plena
de incomensuráveis saberes,
sabores
que em tudo traduzia em vida, forma
e cores?
e a admiração era tanta
o pejo era tão intenso
que nos amarravámos no obelisco
da praça
só esperando ela passar
mesmo que não nos enxergasse
mesmo que nossa reles presença
não fosse sequer pressentida
tudo teria valido, por termos apenas
nos encontrado uma única vez
por termos sido seus discípulos
e sorver cada palavra como se fosse um milagre
aonde andará Che Guevara
os heróis de guerra e revolução,
aquele discurso de palavras fortes
que enxotavam no coração do marasmo e
da acomodação?
aqueles punhos em riste
o cerro de sombrancelhas enfurecidas
e os fuzis dos olhares
a transpassar nossa espúria inércia
por onde andará?
salvadores da pátria
redentores da fé
cavaleiros da esperança
mártires da liberdade
vozes de além tempo
que velavam por valores
humanos,
genuinamente pueris e até inocentes
mas que lutam pelo que temos hoje.
por onde andará?
em quais becos, vielas,
ladeiras, conventos
estarão dormitando
todos esses ídolos
expatriados de nossa lembrança
deserdados de nosso sorriso
permanece nos anais da história
nas colunas gregas do palácio
da justiça
nas placas de bonze
nas inscrições moribundas
dos prédios históricos
sussuram ao vento
o desvario da conquista
incendeiam a glória remota
e sopram cinza todos os dias
sobre nossos pesados ombros
tenho saudades dos heróis
dos humanos que se divinizavam
mas maior saudade dá
quando vejo
o deus que há em nós
ser diariamente sepultado,
crucificado e humilhado
pela iniquidade reinante dos
dias doentemente contemporâneos