poesia perdida
perdi a rima
perdi a poesia
perdi a metade de tudo
e assim partida ao meio
ao léu
continuo a flanar
perdi a palavra
banhada na água benta
perdi a expressão
sou um animal
cheio de dor e grunhido
minha face
é retorcida
minhas lágrimas
são gotas de náusea
e cansaço
perdi o rumo do deserto
o camelo morreu
o oásis distante
é lembrança
é brisa que se sente
no fim da primavera
mas ainda tenho a
lembrança
não tenho mais poesia
mas tenho o flash mágico
a clicar cenas, luzes, cheiros e
sabores instantâneos
de viver assim
tão urgentemente
tão sofregamente
não há mais oxigênio
em meu escafandro
não há mais santidade
em miha redoma
não há mais delicadeza
em meus dedos
em minha alma deserdada
perdi a rima
na ilha cercada de tubarões
no abismo secreto das senhas
perdi a poesia
no segredo dos dias comuns
encontrei a estranha alegria
em simplesmente estar
a flanar,
sobrevoar tudo
bem acima da imaginação,
dos limites
da música intrínseca dos pássaros
quem achar,
peço
favor acenar,
taquigrafar,
escrever,
tossir ou mesmo vomitar.
não importa,
torne e retorne a poesia para que
em tudo esteja... regurgitada
das almas diárias, das árvores velhas,
dos poetas ocasionais,
das crianças que brincam de amarelinha
e riscam o céu
como fim da estrada.