NAQUELA RUA
NAQUELA RUA
mil vezes passei por aquela rua
a casa de tijolinho à vista
com janelas de venezianas verdes
emolduradas em branco
talvez paga no banco por promissórias
em irrisórias prestações
as aves piavam bem-te-vis
nos fios de luz esticados cinzas
como o céu apontado pelos postes
o vaso de gerânios vermelhos
lembrava-me a floreira de minha mãe
mais folhas que flores sobreviventes
atacadas inclementes pela bola dos moleques
um trem de ferro passa num apito longo
vai pra longe
vai pra perto
não importa
os longes da fantasia me levam junto
invento o que quero
lero-lero de voz construída
com argamassa na garganta
de uma lembrança puída em solidão
nos paralelepípedos daquela rua
feito passos de procissão
Mírian Cerqueira Leite