BONECA DE PORCELANA
Na estrada, o pé pisa o Caulino
E a inerte pedra, muda, escorre
E na ação de singular destino
Uma rara metamorfose ocorre
De valor minúsculo e desprezível
A argila, que antes, largada fora
Há de voltar, no fim, irreconhecível
Delicada obra de artífice, sedutora
E a massa disforme e sem valor
Que na existência fica ao vento
Fica morta, até outra vida compor
De beleza que se vê, olhar atento
Mas, para este estado de perfeição
É necessário um fogo de sofrimento
Para mudar a escura cor, em afeição
Num singular resplendor de momento
Até que a inata beleza se revele
Na superfície lisa e bela e fria
Porém só, a espera de quem a vele
A revelar do ego tudo que se sentia
Mas este êxtase alucinante
Que incute nos olhos delírio
Há de tornar-se, em ti, lancinante
Fragilidade eterna e martírio
Essa doçura de feição pura, delicada
Encobre n’alma tudo o que se clama
De não poder ser pessoa plena e amada
Mas uma simples boneca de porcelana.