o mar e o rio
metade dessa lágrima
é o mar
metade dessa lágrima
é o rio
De um lado a água salgada e fria
De outro lado a água doce e morna
Jogo a âncora pesada
nas profundezas do mar
Jogo a alma densa
nas profundezas do corpo
a âncora me amarra em meio o infinito
a alma me prende a um espaço restrito
falta-me ar,
abro a boca e busco oxigênio
transborda de meus poros a palavra,
o gesto,
o grito que não se cala diante da multidão
o medo que não cessa em pesadelo
falta-me o ar
meus olhos saltam do rosto
e, em outras órbitas
buscam a elipse perfeita
o retorno da visão e da lucidez
mas essa lágrima embaça tudo
fica tudo fora de foco
e a surda agora é quase cega
trôpega pelo próprio caminho
estranhando as próprias pernas
ainda que entendesse a força centrípeta
da curva fechada
da reta enigmática
que nos coloca nus perante a verdade
axioma fatal
axioma final
de turvelíneos
metade dessa lágrima é dor
metade dessa lágrima é anestesia
dor humana e vivida
anestesia de quem sente tanta dor
que entorpece
perde os sentidos
perde as âncoras
perde no cristalino dos olhos
a nitidez
a imagem é o prazer do eu
a visão é o prazer do outro
o mar e o rio se encontram
a foz revela a dor de se fundir.