Dias de solidão

Dias de solidão

Não há som

Não há voz

Não há palavra

Lá fora os pássaros dialogam

num idioma que não entendo

Um casal de pombos vem vaiar

A minha existência

E eu, os espanto com varas e gritos

Dias de solidão

Travessia de deserto sem almas

Sem sombra

E sem sol

Só resta o calor intenso

Só resta o frio intenso e úmido

Do litoral

A doer nos ossos o reumatismo recolhido

Dias de solidão

Abandono do abandono

Deito-me a escrever, a ler

A corrigir e endireitar objetos de decoração

todos me parecem tortos

Os quadros que pintei emoções pálidas

Agora me atordoam e

Inundam a casa de mim mesma

E transborda pelas paredes,

Pelas frestas da janela

Lá fora a ventania sibila

Um rangido, um gemido agudo

igual soprano

Folhas em contracanto rompem

A unidade aguda e compõem um contralto

Grave e sonoro

Portas batem furiosas

Os animais se recolhem receosos

E, eu aqui sorvendo

deliciosamente minha solidão

encravada como brilhante

em minha calma

Procuro um espelho

E não me conformo com as sobrancelhas

procuro um chinelo

E não me conformo

de estarem frios e sujos

de estarem rotos

os sentimentos guardados no peito

o amor vai partir,

desaparecer

sem deixar sinal

mas não importa

sentimento transgride tudo

transcende tudo

até dias de solidão.

GiseleLeite
Enviado por GiseleLeite em 12/08/2007
Reeditado em 12/08/2007
Código do texto: T603937
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