MISERICÓRDIA A VÊNUS
Perdido entre as fumaças estava seu coração,
Tentando guiar-se pela luz fria das ruas solitárias da madrugada,
Lançado como um lixo que não tem solução,
Sem poder sentir-se bandido, pois este ao menos era procurado.
Saliva engolida feito cacos de vidros,
Rasgava as entranhas de um ser de pele esfarrapada,
E a lua calada assistia aquela cena,
Sem compaixão não apontava a direção de sua casa.
As gotas de álcool secavam no deserto daquele coração,
E as memorias açoitavam como ressacas de inverno,
Engolido pelo cansaço levantava silenciosamente uma petição,
Misericórdia a Vênus no céu, implorava o fim.
Porque o frio também queima,
A fumaça intensificava,
Embriagado,
Sozinho.
E como se uma força oculta guiasse todas as águas sem rumo,
Chegou naquilo que mal sabia se chamaria de lar,
Debruçando toda a derrota sobre o travesseiro,
Permitindo o corpo vomitar sua alma que encontrava uma fuga nos sonhos.
Pela manhã quem era ele, miserável,
Que cortou as próprias asas,
Se escondendo em garrafa vazia, que gole a gole a fez secar,
E a dor na cabeça fazia lembrar que ali dentro haviam feridas onde as moscas sentavam.
O banho não era fácil, pois enfrentaria seu reflexo nos espelhos,
Caiu ao chão e chorando terminou de esvaziar-se,
Secou-se e viu a luz do sol que fazia arder os olhos,
E entre lágrimas entendeu que fugir era ser transeunte em vias sem rumo, e mais uma vez resolveu tentar.