Inquietude
Quando dizes que não te entendo, é por que de fato não te entendo.
Eu nunca tentei. Nunca me senti disposto.
Somos produtos da grande depressão de nosso tempo, meu amor, da grande e estoica derrota de nossa geração.
Trocamos nossos heróis por cigarros mais doces e máquinas mais potentes. Matamos de fome nossos poetas e sufocamos nossa humanidade na fumaça de uma era de neon colorido e paixões plásticas.
Eu sou teu e não te pertenço. Não sabemos mais pertencer. Odiamos isso tanto quanto odiamos a nós mesmos. Sou o síbilo amargo no momento de dúvida. Sou tua vida e estou acabando um instante por vez.
Tua solidão é teu manto, tua indiferença é tua morada.
Não me toque, não me sinta, não suplique por uma carência que não está lá.
A chaga real de nossa vida é não entender a pretensiosidade fundamental que se faz necessária para suportar o dia a dia.
A falta de esperança e o tormento que te afligem não são mais do que reações a um poema nunca finalizado, verbalizado torpemente em um instante de dor sublime em que o amor que nos venderam pareceu possível e real.
Tal qual todas as coisas reais, ele era uma pálida mentira.
Um eco inquieto de sonhos sonhados por loucos e amadores.
Não me suplique nada. Não espere nada de mim.
Não me peça por conclusões, por teorias, por planos mirabolantes de libertação.
Tal qual eu e você, eles são falhos por natureza.
São humanos, são lamúrias cardíacas de poeira de estrelas mortas.
São sussurros de uma breve nulidade.