A canção de um só
A noite mole deita sobre a vila cansada
[e um poeta canta a canção de um só.
Um fio de solidão se pronuncia na quietude.
Das vagas tristes uma voz serena da deusa
[noturna me acolhe me deita me conforta
[na fina claridade de seus vaga-lumes...
Sou âncora que te firma neste cais.
Sou um oceano de ondas turvas onde portais
[se abrem aos teus cantos virgens.
Sou o pensamento esquecido na mistura das vontades.
Sou um deserto de muitos oásis em sonhos que te dou.
Sou tela de ébano que permito a luz.
Sou a nudez negra do teu canto!
Sou quem te abraça na construção da lira
[e te aqueço na frieza do nada.
Sou quem desenha em tua mente grisalha
[esses traços ricos, esses traços débeis...
Ó amiga de abraços e de silêncios!
Ó complexo de ruídos perdidos nos templos de Noturno!
Ó espaço de estrelas no céu deste abrigo!
Ó barco em devaneios que me conduz a todos os portos!
Ó cúmplice dos cavaleiros em seus segredos e mistérios!
Noite, sua névoa triste abriu-se na vigília que passou.
As asas planaram e acordaram letras.
Vieram versos...
Vieram e cantaram nos pensamentos meus.
Vieram a mim como óleo que me unge a testa
[e eu vi minhas mãos catando palavras
[e borboletas voando, voando, voando
[no túnel dos olhos e caindo em mim...
Noite, não aborte os meus cantares antigos.
Afaste os teus fantasmas...
Não fuja a canção por medo de ti.
Sai-te agora a andar pelos vales modorrentos
[e dorme na rua que a cidade é tua
[e deixe-me sementes de poesia nova
[que eu gero poemas na visitação da Luz.
Boa noite, amiga. Já bebi o vinho que me deste.
Durmo em paz no teu velho oceano...
Sidnei Garcia Vilches. (17/02/2013)