Pinga
Fim de noite
e de semana
e do domingo.
Aqui estou e
nem sei onde
ou quem sou.
Tudo o que
penso e sinto
é vermelho.
Fim de noite
e do sossego
e do equilíbrio.
Me acompanham
meus medos,
minhas frustrações,
minha vergonha.
A torneira pinga,
rompendo o silêncio
(exterior) da minha angústia,
já que, dentro de mim
só há caos
e meu desejo de saltar
do lugar mais alto
e, em meio a queda,
recuperar as minhas asas,
que se perderam ou
foram roubadas ou
por mim vendidas.
Já não me lembro…
A torneira pinga
marcando a passagem
do tempo,
da juventude…
Aliás, eu já sabia:
não é o tempo que
por mim passa;
sou eu quem, inocente e
apressada
passo por ele e
quando me dou conta,
estou a sofrer por
nada além das minhas,
tão minhas próprias
escolhas.
Essa maldita torneira sou eu!
Vazando, derramando
deliberadamente
as gotas da minha coragem,
desperdiçando sonhos
por ter acreditado
que já não me serviam.
Agora me lembro.
Minhas asas, as vendi.
Deixei que me convencessem
que não mais precisaria delas
e comprei as bolas de ferro
que agora me amarram os calcanhares.
Não era por ter asas que eu voava!
É por isso que ando mais dependente
da minha própria ausência
do que destes cigarros amargos.
Por favor, não me procurem.
Preciso perder-me para,
quem sabe, achar-me.
O relógio desperta.
Alguém ajustou a torneira.
Minha covardia toda escorreu
e as últimas gotas foram estes
v
e
r
s
o
s.