Carta Aos Meus Filhos
Quando o meu corpo estiver cansado de mim
Assim… Na velhice tão materialista a minha
Deixem-me continuar a ser
A criança de todas as cores!
Deixem-me falar e, principalmente:
Deixem-me calar.
Gosto do silêncio e ficar dentro de mim mesma.
E não esqueçam que eu muito gosto
Do nascer e do pôr do sol. E de horizontes!
Vou necessitar muito dos horizontes.
Coloram sempre os meus cabelos.
Mas nada assim muito comum.
Cores de massa de modelar!
E não sintam vergonha de mim.
Eu nunca me importei mesmo com o que pensam
Sobre o que as pessoas vêem de fora de mim.
Continuarei preocupando-me em não ferir.
E em não ferir-me ainda mais.
E se por acaso Deus me der o presente
Do esquecimento presente
Lembrem-se que eu estarei a lembrar
Em meus arquivos antigos
Rostinhos de crianças, em três:
Eu e vós. Os dois.
E nós três estaremos a brincar juntos
Nos corredores desta “casa” tão minha.
Não deixem-me sozinha.
Eu gosto muito de observá-los.
Principalmente quando eu não tenho nada a vos dizer.
São as horas em que eu ausento-me de mim
E visito o interior iluminado e vasto de cada um de vós.
Para mim sempre terá paredes limpas
Mas uma única parede apenas que envolve o “eu”
O indivíduo de cada um de vós
Sem paredes algumas no interior
Pois é tudo graminha verde e luz!
E lembrem-se: Eu não preciso muito de coisas.
Eu preciso de abraços adornos!
De anéis que permaneçam alianças entre nós os três.
De brincos beijos de par em par.
E de batom cor de ocre rosado
Para os beijinhos meus nos rostos vossos.
E não me infantilizem ao conversarem comigo.
Sejam amorosos na justa medida de amores sem medidas.
Quando eu começar a dar trabalho para tomar banho
Procurem ser pacientes.
Já ouvi dizer que a água dói na pele quando "gente finda".
Negociem comigo jujubas e boa música após o banho.
De certo eu cederei.
E deixem sempre criancinhas e cãezinhos à minha volta.
Eu não saberia passar os dias sem o “pouso levezinho”
Dos beijinhos que eles sempre têm a nos ceder.
E se eu estiver dormindo, deixem.
Mas se eu estiver morta, me acordem
Assim… Por todos os vossos dias.
Porque eu jamais “morreria”
Que não fosse de amores por vós.
Os dois.
Karla Mello
08 de Dezembro de 2014