SOMBRAS SOBRE OS TELHADOS
Não consigo tirar os olhos
daquelas sombras aninhadas
sobre o telhado de minha casa.
Caminho de cabeça erguida,
procuro grandeza de espírito
para enfeitar minha vida,
mas não consigo desviar o olhar
daquelas sombras imensas.
É como se quisessem me cobrir
para que o mundo não veja
as feridas abertas em meu corpo
pelos dias de solidão,
pelas horas de angústia infinda.
Por isso, canto triste
e canto a tristeza
de ser quem não quis ser.
Lentamente me deixei
despedaçar diante do mundo.
Uma tristeza crescia em mim
e eu nem sabia o porquê.
Algumas pílulas me foram dadas,
fotografias, queimadas
sobre a mesa de cirurgia,
na qual abriram meu peito
e tiraram meu surdo coração
que pulsava, pulsava, pulsava...
para quê?
Para sentir na pele
a solidão maior do mundo.
As sombras me lembram
das perdas que deixei acontecer,
do amor perdido em um segundo,
das pancadas na cabeça.
Lembram que sou só carne
e de má qualidade,
podre em vida, cheia de desalento.
Quem me lê enxerga as sombras.
Mas as sombras me lembram também
da luz que deixei apagar,
da fogueira jamais ardente,
da voz há muito calada
na hora de confessar
querer um amor para sempre.