AMAR O NÃO-AMADO
Republicação – Poema de 1983 (Agora, com versos acrescidos)
 


 
Para o que não se ama
impossível elevadores
só há degraus e vertigem.
 

Este, o mais necessário,
o não-amado,
nos aguarda
no último andar
do incomensurável edifício.
 

É imprescindível alcançá-lo
tentar alcançá-lo...



Procurar linguagem comum
onde não há linguagem nenhuma...




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Amar a quem não nos sabe
a quem não nos pode saber
a quem não conseguimos saber.


O nosso pecado mais miserável de todos.


Amar o visceralmente outro de nós
o geneticamente outro de nós
o estranho
que nos precisaria ser o mais íntimo
mas, não o é... nunca o será...



Amar o estranho que conosco precisa estar
o tempo todo... o tempo todo...
sem qualquer anestesia nem qualquer descanso
nunca
nem para ele, nem para nós.
 



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Só na face do reverso
revela-se a face
do amor mais alto.
 

A face do não-amado
que é toda asperezas
como lhe é aspereza a nossa face.



Para ele  reservemos
nossas melhores carícias.
 

Amar o não-amado
é possuir com clareza
o espaço da nossa dúvida
é ter nas mãos, cristalina,
 

nossa dolorosíssima verdade mais lúcida.