INANIDADE

Há mosquitos ziguezagueando pela sala

Televisão é inodora, incolor e insípida

assim como a água que sai preguiçosa da torneira

mas ao invés de nutritiva é recheada de besteira

Minhas prosopopeias dialogam

pelos cantos da casa,

falam da realidade paralela

e da constante mudança das coisas

que, ás vezes, parecem não mudar nunca

Invento minha fome

Invento minha sede

Invento meu pensamento

que foge pela porta da frente

Relógio não para

Fatos & cenas amiúdes

acompanham a cadência dos ponteiros

Copo de leite gelado. Arroto,

filmes de mil e novecentos e trinta e tantos

Andar pela casa é ser um adorno vivo,

falar sozinho é rutilar sob a luz da lâmpada

Sonhar à noite é perder-se no tempo do mundo

e esquecer que há um mundo e que há um tempo

Devanear é calar-se e esquecer que os olhos enxergam

enquanto a brisa da madrugada sopra para a eternidade

Relógio não para,

jamais poderia parar

A rua é deserto

de concreto

A rua é deserto

sem areia

A rua é deserto

de abstrato

Minha cabeça

não descansa

sobre o travesseiro

Meu corpo

não descansa

sobre a cama

Silêncio nas ruas após a meia noite,

algo está vazio, talvez seja eu mesmo

em torvelinhos de nada se misturando ao ambiente

Relógio não para,

relógio segue,

noite segue,

madrugada segue,

o tempo segue

cada vez que me distraio

Sigo pela madrugada

galgando escafandros

que não querem dizer nada

Leões e águias do mundo real

chegam para me assombrar

em meu calabouço, mas

não os vejo e eles não se multiplicam

Relógio não para

Trafegam reminiscências

explodem flashes na consciência

Enquanto estou estático

cabeludo lunático...

Morpheus