Tapete Panorâmico
Minha ausência nada causa
Imóvel, diante, qualquer passo é contradição
(Qualquer estátua sentiria pena de mim)
Invejo-te, caro anônimo que agora sorri
Vejo em você tudo o que eu não queria ter
Queria sentir... Só um pouco
Gosto de mim... Não tanto
Ao ponto que agora
Gosto mais de você
(Fecho os olhos. Respiro. Abro os olhos
Ah, ainda estou aqui)
Que sou para os bem-ditos bem-sucedidos?
Apenas alguém aqui?!
((Aqui onde, meu Deus?! Apenas alguém?!)?)
Ledo engano, queridos abutres
Morrerão de fome
Meu cadáver pertence
À esta terra, inevitavelmente
Só alimentarei meus outros
Queridos amigos - vermes
Nem a mim eu me interesso
Não há graça
Não cavem a minha cova
Nem tentem conduzir-me à outra
Deixem-me!
Atrevo-me a dizer-lhe tudo, mas nada impedir
Nunca impedi-lo
O mundo é seu!
Faça o que quiseres pois o que criares é nosso
Reclamo, sim, mas o faço ao passo que não reclamo
Necessito de você e de sua fábrica de conforto para sorrir
Não consigo nem me evitar: sozinho ou com alguém
O inevitável é para todos
Há entre mim e o meu fim apenas pensamentos
Passos daqui para a morte
De lá, pouco me importará
Parado, e ainda assim contraditório
Pensamentos são para infelizes e tolos
(Tolos infelizes?)
Minha ausência nada causa a você
Meus defeitos são os meus próprios efeitos
À você, que invejo por estar sorrindo agora
Continue a sorrir
Creio que não seja ilusório
Se quiseres, porém, algum dia
Com desprazer lhe emprestarei os meus olhos
Mas, por favor, queira não se assustar
O mundo ainda será belo, incrivelmente belo!
Põe-se um tapete panorâmico
À um simples ser humano
E nada mais será como era antes
Não mais cônscio
(Complexo, hei de sê-lo?
Não, pelo contrário
Apenas um ordinário a mais)
Mas quero tê-lo, amigo, aqui nas minhas mãos
Jogá-lo quando tornar-se mais vão
que meu próprio amor
Mais torpe que meu próprio coração.