TORMENTOS DE SOLIDÃO (Uma antiga vila)

Quando lá de cima te contemplo, logo pergunto:

Cadê teu verde que não mais vejo, oh grande cidade?

Esse verde que mostra vida, renovação, movimento.

Esse verde que atrai pássaros raros, cigarras, água fresca e namorados.

Embora, até mesmo daquele íngreme morro, já se mostre mais rocha que verde.

Cá de baixo sinto-me esmagado, quão grandes são teus prédios.

À noite, lá no alto da noite, ando por tuas ruas, saudosas, nuas.

Solitário, quebram-me o silêncio uns restos de expediente.

Os que rolam no asfalto abraçados ao vento quente de teus corredores.

Iluminados pela fraca luz de teus postes.

Uma latinha meio amassada de cerveja, esquecida da reciclagem,

De vez em quando rua abaixo cambaleia, completando a aura sinfônica.

Um contraponto em noite escura que sem mais nem menos cessa.

Talvez aquele maestro também ouça o solitário que atravessa.

Mas logo percebo o medo que daqui devo ter, sem mesmo me explicar.

Que saudade de minha pequena vila.

A vila das peladas de rua e do pique esconde das noites de luar.

Sei que restam só lembranças de lá,

Pois o pique esconde de hoje é peleja de arrepiar.

Estrelas cadentes do meu céu de lá,

Hoje são rastros incertos que procuram a morte alcançar.

A cidade desperta. Mais um dia acaba de chegar.

Esse raio de sol, que da fresta o quarto penetra,

Enseja vida que lá fora me espera.

Renova-se a esperança de outros conhecer.

Logo chega o meio-dia, a fome aperta.

Andei rua adentro, um punhado de gente encontrei,

Semblantes dispersos, rompendo que vai e que vem...

Quanta gente e me sinto aqui tão só!

Quanta saudade da minha vila, que não mais posso encontrar.

Exuberante, és mesmo bela, oh cidade grande!

Mas teu calor não esquenta minha alma,

Teu cheiro me entorpece, pobres dos que te respiram.

Ao auge de tua vida meus olhos enegrecem.

Dou-me conta, então, de teus sons estridentes, graves, agudos.

Buzinas, sirenes, burburinho, entorpecentes.

Compreendo aquela dor visceral dos que à noite se recolhem,

Proporcionando teu silêncio, o que tanto me incomoda.

Perturbadoras entranhas de uma sinfonia mórbida.