poema para parto sem dor
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No silêncio eu aprendi da onda,
do mar, de uma memória abissal,
da ventania vazia que é o amor
num poço mais vazio ainda, o de existir.
Aprendi incertezas que me falam surda mente
que não existem tantas respostas ou nenhuma resposta.
E que o nada também é uma chance e um susto
de existir sozinho e se achar profundo e raso.
No silêncio eu vivi tardes vermelhas de olhos acesos.
Eu aprendi a ver melhor o que havia das pedras,
uma linguagem inteira de pedras, uma linguagem de infância e pedras.
Das minhas durezas de alma, das minhas formas perenes de solidão eu adquiri certa lealdade.
E por escolher a solidão como condição de existência não consigo de modo algum me arrepender.
Eu li os poemas de Eliot e me estiquei com as memórias de Proust.
E sei deveras ouvir o som das grutas, das fendas, das águas, dos vales sombrios da alma... Se dez mil cairão nesse chão, tu certamente estarás entre eles.
E fiz pactos com a floresta a compreender a escolha de mudança dos bichos. Partir pode não ser opção.
Descobri que sou um bicho, um bicho faminto, voraz, um bicho a violentar, e um bicho que espreita, obtuso.
E dei de conhecer um temor esfacelado
e uma indomável sede de dizer que não devo fé e que sim, peco o tempo todo.
Qualquer hora enveredo altiva por entre meus bosques de espera
e lá – silenciosamente – na linguagem dos que esperam sem nenhuma humildade -
hei de encontrar do mistério a casa, a lanterna, a terra onde pousarei os ossos desses dias.
Na última casa do último sonho
da última face próspera de esperança...
A criança abandonada atravessará o bosque rindo muito, rindo alto,
- última e corajosa vontade de silêncio.
Patricia Porto