Sincronia
Quatro velas queimam juntas num prato.
O silêncio é tanto que posso ouvir minha própria respiração
e o barulho do voo dos mosquitos.
Tudo é sincronia,
os grilos no quintal,
os carros na rua,
o sexo dos vizinhos,
O nada sobre minha cabeça.
Hoje, nem ao menos tenho com o que me distrair,
Os analgésicos já não fazem mais efeito.
Mas tudo bem. Esta noite, quase agradeço pela dor nos rins. Hoje ela me faz companhia.
Lá de cima, observam-me as nuvens vermelhas,
no céu sobre minha cabeça,
andam vagarosamente,
como as prostitutas da 9 de Julho.
Vez ou outra mandam um pingo gelado sobre mim para me manter acordado.
E assim eu fico.
Nem ao menos meu computador está ao meu alcance hoje.
Risco no papel, em vez disso, com minha caligrafia horrível.
De vez em quando tenho uns calafrios,
e sinto um calor subir a garganta.
Há algo de errado comigo,
além da solidão, além da minha recente misantropia e das pedras nos rins.
Tem algo de muito errado comigo.
Algo muito errado, e digo, mesmo antes da ultima mulher ter me deixado, já vinha me sentindo assim.
Hoje isso parece muito pior.
Talvez porque o colega com quem divido a casa,
tenha esquecido de pagar a conta de energia e me deixado no escuro.