GRITO

Às vezes, apetece-me gritar ao espaço

um grito livre de todas as peias,

distante de todos os medos

e vazio de todas as angústias.

Um grito terrível, animal

e sem significado.

Um daqueles gritos

em que a alma se rasga ...

Um grito selvagem e livre,

como só um grito pode ser...

E no silêncio seguinte,

reconstruir as manhãs de sol

e os cheiros das coisas...

Tornar obrigatórios

os sabores pálidos das frutas raras,

e os perfumes das flores noturnas...

E descobrir em todos os dias seguintes

um amanhã diferente do meu amanhã de sempre...

( como se fosse o último grito,

o último amanhã,

ou a última vez ! )

Portugal, Sto Amaro de Oeiras/1987