DE LONGES TERRAS

Andei por ruas

e veredas

e sertões

morei em tendas

e mansardas

mergulhei em adagas

em fundos punhais

toquei teorbas

e adufes

talvez violinos...

cantei

cantigas sem fim

em noites a sangrar...

vim de longes terras

de Portugal, de Espanha

de médios orientes

de algures...

mexi em largas feridas

algumas estanquei

outras abri mais

-sem jamais o pretender

espécie de destino

de loba e ser gregário

odalisca

cigana

talvez vestal

quiçá meretriz

loba gregária

nem liberdade

nem entre iguais

de espécie (?)

me é dado viver

nenhuma

que não podia

que não devia

que precisava

para o bem de tantos

ter sido deixada num mosteiro

assim que nascida

e de lá

jamais ter saído

jamais

e seus olhos

como lanças

que a si mesmos ferem

de morte

qual édipo (?)

esses olhos

que veem

fundo

e sempre

inutilmente

nossos desertos

seres de mim

seres em mim

tantos...

tantos...

cada vez mais tantos...

impotente de mim,

impossível de mim

impossível de nós

impossível de ir-me ao encontro de algo...

de alguém...

com este coração

a quem é perigoso

mesmo interditado sentir

amores novos

por amor

por causa de uma alma

só de fidelidades

lúcidas

agonizantes

ancestrais

recém-nascidas

solidão

sem escolhas

de partir

nem para o amor

nem para anestesias quaisquer

amada

por que

para quem

amante

para ninguém

como vestal

nem para si.

Ai, pobre de quem

enxerga longe

enxerga triste assim.

De primeira, nesta madrugada de 27 de setembro de 2012.