Geografia da chuva
Chove torrencialmente lá fora
As gotas escorrem desesperadas em
direção ao chão, ao rio, ao lago e ao mar…
Raios bradam iluminando subitamente
a noite fria
O Beethoven toca ao fundo em sinfonias
Tão tempestuosas quanto a borrasca lá de fora
O vento sopra soberano e varre de mim
Todas as idéias, todas as mágoas
As sombras molhadas se apagam da memória
Lavando tudo numa profusão de água e azul.
Fica essa sensação úmida e vazia,
Frio denso e doído
Percorrem os ossos, corroem os dedos
A chave caída num canto parece rir
do segredo da fechadura
A chuva parece rir do dia,
do sol quente e inclemente
do suor enigmático
O vento parece rir
Do abafadiço lânguido
Do fim da tarde…
A natureza ri e gargalha
ao som dos trovões
operísticos
Que amedrontam e fascinam
Na varanda por entre gotas e lágrimas
Há um arremedo de sentimento,
Há uma quase-palavra
Que dorme ao relento
Em plena chuva
Que salva em pequenos botes
O significado das pequenas coisas,
Miúdas e imensas
Profundas e tangentes
O significado do dia
O significado da selva interna
Da chuva que inundou o dia
De semântica e calma.
Sob olhar do relevo humano da face.