A FACE DA CHUVA
Quero sair na chuva
Andar de bicicleta
Ou navegar na enxurrada
Quero tanger o gado da saudade
Nas altas madrugadas
Lá pelas tantas
Só pra mudar o ponto de vista
Quero sair para jantar
Sem se preocupar em gastar
Isso é coisa de economista
Talvez lá encontre alguém
Que me queira bem, bem mais do que sou
Ou, quem sabe, ele esteja em minha cozinha
Pois um homem, pela boca, se conquista
Não quero ficar sozinha
Porém, hoje, não vou morrer de fome
Ponho a mão na massa
E, na massa, camarão e queijo
Mesmo não combinando
Manjo tudo e ainda lanço um beijo
Brindo tudo com um bom vinho
Apreciando a noite do terraço
De repente, me dá vontade de chorar
Separar-me de mim mesma
Não por maldade, foi por acaso
Um beijo pra ter certeza
Que eu não era só boa de cama,
Mas também na mesa
Eu gelei, misturei carência com bobagem
Confundi amizade com egoísmo contundido
Chamei de pai a quem era filho
Fiz da esposa o marido
A amizade verdadeira
Parecia um jogo concebido
Estou perdida, angustiada, feliz
Talvez não seja nada
Foi uma noite bem dançada
Agora um sapateado de salto alto
Pra eu perder o equilíbrio
E sentir o martírio da falta de alguém
O melhor de um amor é a amizade
Às vezes, uma droga tanta verdade
Mas vou vivendo intensamente
Deixando tudo acontecer naturalmente
Me corroendo demais por todo medo
Dos porquês, quando, onde ou como
E até as explicações pedem socorro
Respostas nem sempre nos trazem alegria e prazer
E as dúvidas conheço como a palma da mão
Será um bom motivo pra ficar feliz?
Não sei qual a razão, nem sim, nem não
Que o destino se encarregue da partilha
Eu sigo minha trilha, amiga e companheira
Sem ferir os meus princípios
Nem os próprios meios pra chegar
Ao talvez, ao jamais ou, finalmente, ao destino
Ninguém pode impedir que o destino siga seu caminho
Entretanto, nem sempre ele pensa nas consequências
Então por que eu é que tenho que pensar?
Ser madura, ser legal? Ser a certa, especial?
Sei que minha casa tem um cheiro diferente
Tem o perfume envolvente de um lar
Onde sempre dá vontade de ficar
Hospedar a imaginação, a emoção, e o coração
E ainda sobra lugar pra esperança
É como se fosse um colo de mãe
Com calor e aconchego, cumplicidade total
Conhecimento de causa, estrutura formada
Para uma aventura recém inaugurada
Tem coisas que são inevitáveis
Podem ser círculos viciosos
Um beco sem saída, uma incógnita do destino
Então dançarei conforme a música
Vou deixar o barco me levar
E se um lugar estiver vago, alguém ocupará
Tem um fluído no ar, não posso negar
Não estou cega, mesmo sendo vapor
Posso sentir o calor espalhando
Essa tensão estranha querendo me agarrar
São arcos-íris brilhantes
Movimentando-se numa dança suave
Prontos para me verem estrelar
Tantas coisas não queria viver e vivi
Não será agora que vou interferir
na força que impede meu egoísmo
De ser insensível; ponho os pés no solo
Hoje, mais que ontem, eu quero colo...