Coração De Debutante

Há uma mal ígnea idade

Pulsando subterrânea, imersa

No coração de trevas dessa sociedade

Há uma cidade globalizada, imensa

Pulsando, hipertensa, no coração das evas

Por sob a laje da maquiagem a face adolescente

Esconde a antiguidade esplêndida, tóxica

Palpitando tensa pelos ventrículos e aurículas

De uma juventude aparente, apenas cronológica

A jovem princesa pré-histórica veste o “jeans”

Vai ao shopping, sente-se dona da cocada preta

O “cofrinho” aparecendo como quem não mostra

O celular diante dos lábios risonhos, toda cocota

A vaidade e a aparência são seu único esporte

A Fulaninha está ficando com o Ricardão

A Vera veste a grife da moda. A Rita sorri

Na falta de assunto. Descobriu o direito

Inalienável de dizer tolices igual a Cássia

Qkiss, a Janaína, a Camila, a Sandrinha

Como se tivessem todo tempo do mundo à mão

Solta o verbo e se perde mil vezes como se fosse

Sherazade contando às outras concubinas

Todos os meandros dos desejos pervertidos

Do sultão.

Todas soltando a fácil franga do besteirol

Em seus discursos bisonhos. As princesas

Pândegas desejam ressaltar a corcunda. Reinar

Segundo os padrões de obscuridade da cultura

Nem sabem como são tão iguais às garotas

Do shopping no outro lado do mundo da bunda

Desconhecem que existem apenas para ser

Mercadorias que compram. Como saber que

Podem nunca despertar desse sono profundo?

Mikito, Youky, Yoko, Kaori, Yeoh, Ziyi, Shana

Garotas! Tantas! Virtualidades fósseis do ocidente

Do oriente. Princesas fazendo pulsar via diástole

E sístole as atrações tão atuais, tão ancestrais. Tão

Pânicas. Pulsa coração em cada pedaço de pizza

Nos goles de coca-cola, nas amizades até a vista

Dos projetos de graduação, para as academias dos

Doutorados do samba.

Hoje vai ter festa de aniversário na Alameda

Bundalelê, cem número. Ou será número cem?

A família da sala de jantar vai comemorar os

Quinze anos da Mocinha do Além. A debutante

Em plena glória ígnea dos neurônios em profusão

Trancou-se no quarto e se aplicou uma overdose

De desilusão.

O poeta a cantou numa poesia. Que pequeno

Grande coração ela possuía. Vísceras que não

Cresceram. E um estômago, veja, cheio de soda

Cáustica, não obstante tanta propaganda de

Refrigerantes e cervejas.

A nova ordem mundial não conseguiu globalizar

Na alcova da sala de jantar um pouco de poesia

Em sua festa de aniversário

Era tudo que ela pedia.

Levou junto com ela um peito desfeito

Em solidão e mágoas. Dizem que ela era

Mesmo diferente de suas amigas.

DECIO GOODNEWS
Enviado por DECIO GOODNEWS em 19/04/2010
Reeditado em 19/04/2010
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