Nada tenho

Nada tenho comigo

Trago a alma pendurada

no prego da existência

A balouçar pelo humor dos ventos

Nada tenho comigo

Na bolsa, na carteira ou

No crayon dos olhos...

Trago o risco do olhar

A voz forte e meio grave

E a boca a pronunciar sentenças

Sem o bater do martelo

Nada tenho comigo

Nem as lembranças,

Nem os amores antigos,

Nem fotografias amareladas

Nem poemas mortos

Encarcerados em primaveras findas

Ou invernos em forma de cristais.

Nada tenho comigo

Nem a liberdade de dizer,

De fazer, de querer...

Meu desejo é do tempo,

Meu prazer é estória.

Meus passos são da estrada...

E transitam pelo destino e pelo

Abismo do mesmo jeito...

Nada tenho comigo

Essa infinitude contida entre as mãos

Esse arco da promessa

Por debaixo dos arco-íris

Queria ouvir a voz do guerreiro

Sua humanidade sofrida,

Suas mazelas latentes...

Seu ranger de dentes

E sentir em seu corpo

O depoimento de delito ou bravura

De êxtase ou decepção

Mas ouvir-lhe...

Seus fonemas castrenses

Suas lanças ponteagudas

A lançar corpos

na morte em cárcere

A lançar corpos sem almas

A lançar silêncios

em meio ao turbilhão.

Com a mesma exatidão da

Palavra.

Queria meu guerreiro particular

E, o escudo da esperança a

Me poupar do desespero.

Nada trago comigo,

Somente esse poema.

E a incógnita do lirismo.

GiseleLeite
Enviado por GiseleLeite em 31/01/2010
Código do texto: T2061341
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