Fim de tarde
Nossos sonhos (que eram tantos)
Morreram num fim de tarde,
E um triste adeus, sem alarde
Consumou a despedida;
Uma lágrima sentida
- prenúncio do desenlace -
Correu na lívida face
À procura de guarida.
Embriaguei-me em seu corpo
Co'o licor da juventude,
Em troca, dei-lhe o que pude:
Carinho e experiência;
Embalei com paciência
Seus sonhos primaveris
E, sem saber, fui feliz
Suprindo nossas carências.
No furor das tempestades
Sequei com risos seu pranto;
Dos beijos fiz acalantos
Para as frias madrugadas;
Dos braços fiz a enseada
A esse barco peregrino
Que navega sem destino
Com as velas enfumadas.
Perdura ainda em meu peito
O calor dos seus afagos,
E em minhas mãos inda trago
A maciez de seus seios:
Alva taça dos anseios,
Reduto de meus desejos,
Lira carente de harpejos,
Vertente de devaneios.
Hoje somos dois estranhos,
Trilhando o mesmo caminho,
Bebendo do mesmo vinho
Que co'o tempo envelheceu;
Não fui eu quem a perdeu
Ela sim, se houve alguém;
Só perde aquele que tem
E ela...jamais me pertenceu.
Jorge Moraes - Livro: Quando os sonhos ganham asas